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Enfim a abolição! - O fim de 300 anos de trabalho escravo

01/1888

No começo do século XIX, o escravismo era uma sólida instituição no Brasil que determinava a sua economia, com raízes na forma de organização social e na cultura. O modelo escravista havia sido implantado no século XVI, com o início da produção da cana e da instalação dos engenhos de açúcar. Em algumas regiões, como a Bahia, os escravos chegaram a representar 75% da população.

A posse de um escravo equivalia a certa posição social. Trabalhar era atividade de escravos. Valorizava-se o ócio e não o trabalho. Em seu livro Cultura e opulência do Brasil, o jesuíta Antonil descreveu o escravo como “os pés e mãos de seus senhores”. Mais do que extensões do corpo de seus proprietários, os escravos eram objetos passíveis não só de serem comprados e vendidos, mas também de serem legados em testamento. Sem falar da violência a que estavam sujeitos.

A descoberta do ouro fez crescer ainda mais a demanda por mão de obra. O comércio de escravos tornou-se um negócio muito lucrativo e, logo, a economia brasileira passou a depender do tráfico e da escravidão. No final do século XVIII, os traficantes brasileiros eram os homens mais ricos da Colônia. Em meados do século XIX, a Inglaterra assumiu uma política de combate ao tráfico de escravos, aprovando uma lei que autorizava o ataque a navios de traficantes em águas internacionais. Inicialmente, houve certa resistência, inclusive aumento desse comércio. A repressão ao tráfico se intensificou com ataques a navios até mesmo em portos brasileiros. A discussão estava aberta.
A Sociedade Auxiliadora da Indústria Nacional não deixou de se posicionar favorável à repressão ao tráfico de africanos. Vários artigos publicados em seu periódico criticavam a utilização da mão de obra escrava. Para os membros da SAIN “os escravos desacreditam infelizmente o trabalho” em si, e o país não poderia ser “civilizado” enquanto durasse “esse comércio infame” (1844). “O cancro da escravatura é o sorvedouro de toda a substância dos brasileiros...” (1845).

Começou-se a discutir a possibilidade de trazer imigrantes europeus e asiáticos para substituir o trabalho escravo nas lavouras de café, que estavam em plena expansão. Uma série de textos em prol da vinda de colonos para o Brasil foi também publicada no periódico O Auxiliador da Indústria Nacional. Finalmente, em 1850, o governo brasileiro cedeu à pressão inglesa e decretou a Lei Eusébio de Queirós, proibindo a entrada de escravos no Brasil.

No ano seguinte, um artigo de O Auxiliador, comentando o fim do tráfico, resumiu bem o que significava a escravidão para o Brasil e para a indústria no país: “O tráfico de africanos – peçonhento veneno – que se infiltrando em nossos hábitos e costumes ia pouco a pouco sufocando nossa nascente indústria, corroendo a riqueza nacional e fazendo calar nossos sentimentos de liberdade”.

A proibição do tráfico internacional não significou o fim do trabalho escravo no Brasil. O comércio interno permaneceu, com um movimento Nordeste-Sudeste. Em 1880, o periódico apresentou dados sobre a população escrava, que havia se elevado para 1,4 milhão de indivíduos. Os dados sobre esse “comércio infame” são assustadores. Seria preciso esperar ainda um bom tempo pela abolição total da escravidão no país, o que só aconteceria em 1888. Durante esse tempo, O Auxiliador prosseguiu com artigos sobre o trabalho livre e como produzir com trabalhadores assalariados, entre outros.
O tráfico de escravos transatlântico foi o maior deslocamento forçado de pessoas ocorrido na história mundial. Entre 1560 e 1850, o Brasil foi o principal e maior destino de escravos nas Américas e foi a última nação desse continente a abolir a escravatura. O Auxiliador da Indústria Nacional comemorou, como quase toda a população do país, o fim dessa vergonha nacional, publicando em destaque, na primeira página, o texto da Lei Áurea, fugindo totalmente do seu padrão normal.